8 de abril de 2013

Atrasos elevam risco de racionamento de energia

Não bastassem as incertezas relacionadas à conclusão dos estádios de futebol para a Copa do Mundo de 2014 ou quanto às condições dos aeroportos, o setor energético também dá sinais de que enfrentará uma corrida contra o tempo até o começo do mundial. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), 48% dos 6.149 MW (Megawatts) referentes a projetos de geração de energia previstos para o ano que vem enfrentam impedimentos para entrar em operação. Na área de transmissão, 4.191 quilômetros de linhas para 2014 estão com o cronograma atrasado. Dos 80 principais projetos do país previstos para o período de 2013 a 2015, 53, ou 66%, estão com atrasos. Há problemas, ainda, na distribuição. Além disso, 27% das obras consideradas obrigatórias nas 12 cidades que vão sediar os jogos não serão concluídas no prazo previsto. Algumas contam com previsão de término para depois da Copa.

Na área de geração de energia, os atrasos são liderados por projetos de energia eólica e térmicas de biomassa. No caso das eólicas, 83% da energia prevista têm cronogramas atrasados devido, principalmente, à falta das linhas de transmissão. Elbia Melo, presidente-executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), diz que a burocracia na concessão de licenças por parte do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) também explica o volume de atrasos.

— Um parque eólico precisa ter uma linha de transmissão para estar interligado no sistema. Mas o governo fazia um leilão só para parques eólicos e outro para linha de transmissão. O tempo de construção das linhas foi mal dimensionado. Por isso, a partir deste ano, só haverá leilões de eólica onde houver linhas de transmissão — disse Elbia, lembrando que a energia eólica vai passar de 1,5% para 2% da matriz energética até o fim do ano.

Nas térmicas a biomassa, do total previsto para 2014, 88,5% contam com problemas para entrar em operação. Em 2013, o número também é relevante: 42,9% estão atrasados. Segundo Zilmar Souza, gerente de Bioeletricidade da Unica, que reúne produtores de álcool, os atrasos estão relacionados à crise financeira, iniciada em 2008, que afetou grande parte dos produtores de cana-de-açúcar. Com isso, diz, houve redução nos investimentos.

— É preciso que o governo crie uma política de longo prazo para o etanol, fazendo leilões específicos de bioeletricidade — disse Sousa.

O professor Luiz Pinguelli Rosa, diretor da Coppe/UFRJ, destacou que o setor vive um momento difícil, pois as empresas terão queda em suas receitas por causa da Medida Provisória (MP) 579, que tratou da renovação das concessões, o que pode prejudicar o andamento das obras.

Chuva afeta obra em linhas para o rio Madeira

De acordo com dados do Plano Mensal de Operação (PMO) do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) deste mês, o risco de ocorrer um racionamento de energia no ano que vem é de 9%, quase o dobro da média histórica do setor, de 5%. Só agentes do mercado têm acesso ao índice, que O GLOBO obteve com exclusividade. O percentual de risco de déficit é calculado mensalmente pelo ONS com base em mais de mil cenários da hidrologia dos rios que ocorreram nos últimos 20 anos, explica o especialista Rafael Kelman, da PSR Consultoria. Com esse índice, os agentes realizam simulações do Sistema Interligado Nacional (SIN). A partir disso, é apontado o risco de corte no fornecimento de energia (racionamento) devido à falta de água nos reservatórios por causa da menor quantidade de chuvas, como ocorre atualmente.

— Não há ninguém tranquilo em relação ao abastecimento de energia em 2014. Por enquanto, a situação hidrológica não é boa, estamos terminando o período de chuvas com cerca de 50% de água nos reservatórios e, contando com os atrasos nas obras, há um risco de déficit de 9% em 2014. Não é um cenário alarmista, é sim, desconfortável — destacou Kelman.

Roberto D’Araújo, diretor do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico (Ilumina), diz que 9% é um número alto. Para ele, o descompasso entre planejamento e operação faz o Brasil seguir em direção a um caminho perigoso.

— Os problemas de 2012 vão se refletir em 2014. O planejamento feito pelo governo é muito otimista — afirmou D’Araújo.

O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, contudo, garantiu que não existe qualquer risco no fornecimento de energia para este ano e o próximo.

— O abastecimento está garantido tanto para este ano como para 2014, sem problemas. Mas é claro que esses atrasos são indesejáveis — disse.

Alessandro da Fonseca Cantarino, superintendente de Fiscalização de Serviços de Geração da Aneel, explicou que já neste ano alguns empreendimentos eólicos, apesar de prontos, não poderão contar com linhas de transmissão, porque não foram concluídas.

Segundo a Aneel, dos 166 projetos de transmissão previstos para este ano, 89 (54%), estão com obras atrasadas. Já para 2014, dos 86 projetos previstos, dez estão com seu cronograma atrasado (12%). A Aneel informou que os atrasos, de três a 18 meses nas obras, impedem a entrada em operação de 600 MW de geração eólica.

— Estamos tentando conseguir uma convergência maior entre geração e transmissão — disse Cantarino, lembrando que licenças ambientais, financiamento do projeto e chegada de equipamentos são acompanhados pelos fiscais da agência.

A falta de linhas pode afetar a transmissão da energia gerada pelas usinas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, em Rondônia, para a região Sudeste. Atualmente, a construção dessas duas linhas, de 2,4 mil quilômetros cada está com o status de “atrasado” na Aneel. Segundo uma fonte do governo, há um esforço para que uma das linhas fique pronta até o fim do mês, o prazo previsto. A segunda linha tem previsão para abril de 2014.

O diretor técnico do consórcio IE Madeira, responsável por uma das linhas, Armando Araújo, disse que, dos oito trechos, cinco estão prontos. Os três últimos, disse ele, estão com maiores dificuldades, principalmente por causa das chuvas.

Kelman, da PSR, lembrou que a usina de Santo Antônio já começou a gerar energia, que está sendo consumida pela região Norte. Mas, com o aumento da geração, essa energia terá de ser transportada para o Sudeste.

Apesar dos problemas, o presidente da EPE lembrou que neste ano está previsto um recorde de acréscimo na oferta de energia, de cerca de 8 mil MW. Além disso, afirmou que entrarão em operação cerca de 8 mil quilômetros de linhas.

O presidente do Acende Brasil, instituto de pesquisas do setor elétrico, Cláudio Sales, destacou que o déficit previsto para 2014, se acontecer, poderá ser controlado pelo ONS.

8 de abril de 2013